quinta-feira, 21 de abril de 2016

Curta João Brandão adere ao punk na TV Brasil

Com o Blog Tosco Todo ainda focando no punk rock no audiovisual brasileiro, trago esse video que foi exibido no ultimo dia 20 de Abril com uma entrevista com Ramiro Grossero, diretor do curta "João Brandão Adere ao Punk" no programa Revista do Cinema Brasileiro.
Ramiro Grossero - Diretor de João Brandão adere ao punk
Ramiro Grossero, nascido no Gama-DF, ele é arte-educador e usa a vivência da sala de aula e das ruas para dirigir seu primeiro curta-metragem. Baseado no conto homônimo de Carlos Drummond de Andrade, João Brandão, estudioso de fenômenos sociais, dedica-se no momento à pesquisa do punk. Com roteiro do próprio Ramiro Grossero, fotografia de Júlio Mautner, Pedro Henrique Aguiar e Ricardo Grilo, a montagem ficou com William Araújo. A direção de arte ficou com Ramiro Grossero, William Araújo e Fabíola Lima. O curta tem ainda na edição captação de som por conta de Edmilton Alves da Silva e trilha sonora sob a responsabilidade de Fofão e Ricardo Grilo.
LUZ, CÂMERA….AÇÃO PUNK !!!!
(Release publicado por Tomaz André no www.zineoficial.com.br ).
Um curta-metragem produzido no Distrito Federal, o veterano punk paulista Ariel Invasor, vocalista das bandas Invasores de Cérebros e Restos de Nada, dois pilares do punk rock brasileiro, faz papel de Carlos Carlos Drummond de Andrade, em adaptação de crônica escrita pelo próprio Drummond: “João Brandão Adere ao Punk”. A direção do curta é do punk brasiliense Sangue Ralo, baterista da banda Canibais e professor da rede pública de ensino. Nas filmagens figuram importantes nomes da cena punk candanga como, por exemplo, o cartunista Broba, ex-vocalista e letrista da banda Cegos, Surdos e Mudos. Para o papel da personagem João Brandão foi escolhida uma figura ímpar da contra-cultura do Distrito Federal, o poeta J. Pingo.
O personagem João Brandão ganhou vida pelas mãos de outro poeta, e também cronista, o mineiro Carlos Drummond de Andrade, que fez uma análise contundente sobre o movimento punk no Brasil. O texto de 1983 surpreendeu pelo entendimento demonstrado pelo autor sobre o assunto, sem o preconceito que muitos intelectuais e jornalistas imputavam ao movimento.
Drummond morou anos no Rio de Janeiro e de lá alavancou sua carreira. Após a morte, o escritor ganhou estátua na Cidade Maravilhosa e todas as pompas de cidadão carioca, sem jamais esquecer sua herança mineira, com especial atenção ao que ocorria na vida política e social do País. Com propriedade de quem conhecia o Rio e os modismos lançados a partir da metrópole, festiva para a burguesia e sede de uma mídia poderosa, o escritor alfinetou os  “moderninhos” com sua crônica “João Brandão Adere ao Punk”, publicada ainda sob o regime militar, no Jornal do Brasil. Na crônica, Drummond apresenta João Brandão, um estudioso de fenômenos sociais, modismos e frivolidades, que passa a se dedicar à pesquisa do punk. As conclusões da personagem ilustram um pouco os motivos pelos quais Carlos Drummond de Andrade merece estar no topo da lista de autores mais lúcidos da literatura nacional. Na fala de João Brandão, Drummond dá respostas a uma entrevista fictícia, que transcreverei a seguir, suprimindo as perguntas.
João Brandão diz: 
“Ainda não cheguei a nenhuma conclusão, Mas suspeito que o punk veio atender às necessidades do País nesta conjuntura (…) Não me refiro, é claro, a modalidade do punk cultivado pelas classes alta e média da Zona Sul. Este é um punk de espírito e camisetas importados, jaqueta de couro valendo um punhado de dólares. É artigo de importação, que deve figurar na lista de produtos proibidos pelo Delfim (Nota: ex-ministro do Planejamento, no governo Figueiredo). Refiro-me ao outro, o de camiseta adquirida na rua Senhor dos Passos e rasgada. O moço não a rasgou para demonstrar maior identificação com o punk: ela está rasgada porque é velha e muito batida. Em suma, o punk pobre. (…) Faz muita diferença, porque o punk dos pobres, suburbano e sofrido, revela no seu despojamento, que para ser punk é necessário enfrentar uma barreira e abrir mão de toda a sociedade de consumo. Ao passo que o Leblon é consumista, no esquema clássico. (…) Não importa que a sociedade seria dos dois grupos e os tolere igualmente, enquanto a indústria fabrica objetos sofisticados para o uso do punk de salão. Importa é a atitude deles diante da vida. Um finge contestar, outro contesta mesmo.(…) Porque os punks malditos sabem que, passada a moda, eles terão de inventar outra forma de lazer que seja protesto, ou outra forma de protesto que seja lazer, ao passo que os ricos não estão ligando para isso, o futuro deles está garantido, na medida em que podem garantir alguma coisa no mercado de vida. Então eu simpatizo com o punk despojado, mau poeta e mau cantor, mas empolgado pela missão que se atribui, de destruir a ordem conservadora por meio da música, do grito, do gesto e do anarquismo primário.”
Voltando aos meus comentários, a publicação da crônica “João Brandão Adere ao Punk” em 1983, no então poderoso Jornal do Brasil, ficaria distante para novos punks, aqueles que surgiram depois da moda a qual Drummond se referiu, se trechos não tivessem sido reproduzidos em diversos fanzines ao longo de anos. Depois de ler a crônica pela primeira vez, apresentada por um amigo engajado no movimento, fiquei a imaginar a personagem e o autor com imensos topetes moicanos, ou outro visual que identificasse os dois como punks.  O tempo passou rápido. Enquanto arquivei em um ponto obscuro as imagens que a leitura despertou em meu cérebro, uma turma do DF resolveu, mais uma vez, trazer João Brandão à luz… Luz, câmera e ação! Sob a direção do amigo Grilo, atualmente baterista da banda candanga Os Canibais, terminaram dia 09 de junho de 2012, sábado, as filmagens do Curta “João Brandão Adere ao Punk”, com trabalhos técnicos da produtora UP Filmes. Grilo assina a direção dos trabalhos como Sangue Ralo. Assina também o roteiro. No elenco, fazendo o papel de Carlos Drummond de Andrade, está o punk paulista Ariel, vocalista das bandas Restos de Nada e Invasores de Cérebros, dois pilares do punk nacional. O poeta e ativista cultural brasiliense J. Pingo também integra o elenco, fazendo o papel de João Brandão, personagem central da trama. Os figurantes do curta são conhecidos na cena punk candanga, entre os quais, integrantes das bandas The Insult, Mackacongs 2099, ARD, Marmitex S.A. e Canibais.
Juntamente com a banda brasiliense Galinha Preta e a paulista Invasores de Cérebros, todas as bandas citadas no parágrafo anterior participaram de um grande show a partir das 18 horas no Mercado Cultural Piloto, localizado no Jardim Botânico. Durante as apresentações foram captadas as cenas finais do curta “João Brandão Adere ao Punk”, baseado na crônica homônima de Drummond de Andrade. Quem compareceu pode se orgulhar no futuro de ser figurante desse filme histórico. A “cereja do bolo” da festa, no entanto, é a participação do cartunista candango Broba, morador da cidade de Ceilândia. Rai, como Broba também ficou conhecido no movimento punk do DF e Entorno, fez contribuição aleatória ao que foi escrito por Drummond. Com traço forte, o cartunista ilustrou com visão própria, e bastante apropriada, a crítica punk aos status quo. Além de animações de seus desenhos, inseridas na edição final do curta, Broba fez figuração como zelador do prédio de João Brandão, participando de todas as captações de imagem.
Para finalizar, devo dizer com angústia que jamais saberei de detalhes preciosos. Após conversar com o diretor Grilo Sangue Ralo na manhã que antecedeu a finalização do curta, tenho certeza que peculiaridades do filme “João Brandão Adere ao Punk” não estarão na edição final, mas nas lembranças de quem abraçou a causa. Foram feitas tomadas quarta-feira, dia 07 de junho de 2012 no centro comercial Conic e no Bar Beirute, redutos tradicionais da boemia maldita em Brasília, com boca livre e bebida à vontade em um banquete oferecido pelo dono do Beirute, o senhor Chiquinho, empolgado com o filme. Na quinta feira a equipe técnica e o elenco seguiram para novos trabalhos em locais onde permaneceriam fazendo filmagens também na sexta e no sábado. Esses locais foram o Mercado Cultural Piloto, espaço cultural localizado na Região Administrativa do Jardim Botânico, e ruas de São Sebastião, cidade próxima. Muita coisa deve ter rolado entre os deslocamentos do Jardim Botânico para São Sebastião, dois exemplos, cada qual com sua carga, de como nas cercanias de Brasília foram instalados núcleos habitacionais sem infraestrutura de saneamento ou serviços públicos, esquecidos anos a fio pelo governo. Repousa aí uma coincidência: O Rio de Janeiro, também conhecido como “A Cidade de São Sebastião”, foi de onde Carlos Drummond de Andrade disparou para todo Brasil as percepções da personagem João Brandão sobre o movimento punk e seu grito contra desigualdades sociais. Com as filmagens do curta dirigido por Grilo Sangue Ralo, a Cidade de São Sebastião, no Distrito Federal, e os condomínios com casas elegantes no Jardim Botânico, repaginam a obra de Carlos Drummond de Andrade, que se recusou entrar para a Academia Brasileira de Letras, de maneira que faria o autor aplaudir o filme com entusiasmo. A periferia de Brasília, com ilustres convidados de Goiás e São Paulo, invadiu a corte com punks verdadeiros, sem pedir licença.
Tomaz André ( www.zineoficial.com.br )